sábado, 18 de julho de 2009

"Alto é o sol e, no entanto,
põe-se sobre lodo e barro."

Al-Asamm Marwanî
"Só há duas maneiras de viver a vida:
uma é pensando que nada é milagre,
a outra é pensando que tudo o é."

Ibn Al-Arabi

segunda-feira, 6 de julho de 2009

A FÊNIX


Na Índia vive um pássaro que é único: a encantadora fênix tem um bico extraordinariamente longo e muito duro, perfurado com uma centena de orifícios, como uma flauta. Não tem fêmea, vive isolada e seu reinado é absoluto. Cada abertura em seu bico produz um som diferente, e cada um desses sons revela um segredo particular, sutil e profundo. Quando ela faz ouvir essas notas plangentes, os pássaros e os peixes agitam-se, as bestas mais ferozes entram em êxtase; depois todos silenciam. Foi desse canto que um sábio aprendeu a ciência da música. A fênix vive cerca de mil anos e conhece de antemão a hora de sua morte. Quando ela sente aproximar-se o momento de retirar o seu coração do mundo, e todos os indícios lhe confirmam que deve partir, constrói uma pira reunindo ao redor de sí lenha e folhas de palmeira. Em meio a essas folhas entoa tristes melodias, e cada nota lamentosa que emite é uma evidência de sua alma imaculada. Enquanto canta, a amarga dor da morte penetra seu íntimo e ela treme como uma folha. Todos os pássaros e animais são atraídos por seu canto, que soa agora como as trombetas do Último Dia; todos aproximam-se para assistir o espetáculo de sua morte, e, por seu exemplo, cada um deles determina-se a deixar o mundo para trás e resigna-se a morrer. De fato, nesse dia um grande número de animais morre com o coração ensanguentado diante da fênix, por causa da tristeza de que a veem presa. É um dia extraordinário: alguns soluçam em simpatia, outros perdem os sentidos, outros ainda morrem ao ouvir seu lamento apaixonado. Quando lhe resta apenas um sopro de vida, a fênix bate suas asas e agita suas plumas, e deste movimento produz-se um fogo que transforma seu estado. Este fogo espalha-se rapidamente para folhagens e madeira, que ardem agradavelmente. Breve, madeira e pássaro tornam-se brasas vivas, e então cinzas. Porém, quando a pira foi consumida e a última centelha se extingue, uma pequena fênix desperta do leito de cinzas.
Aconteceu alguma vez a alguém deste mundo renascer depois da morte? Mesmo que te fosse concedida uma vida tão longa quanto a da fênix, terias de morrer quando a medida de tua vida fosse preenchida. A fênix permaneceu por mil anos completamente só, no lamento e na dor, sem companheira nem progenitora. Não contraiu laços com ninguém neste mundo, nenhuma criança alegrou sua idade e, ao final de sua vida, quando teve de deixar de existir, lançou suas cinzas ao vento, a fim de que saibas que ninguém pode escapar à morte, não importa que astúcia empregue. Em todo o mundo não há ninguém que não morra. Sabe, pelo milagre da fênix, que ninguém tem abrigo contra a morte. Ainda que a morte seja dura e tirânica, é preciso conviver com ela, e embora muitas provações caiam sobre nós, a morte permanece a mais dura prova que o Caminho nos exigirá".

Farid ud-Din Attar, "A Linguagem dos Pássaros"

SOBRE A CALÚNIA


Não fales mal sobre o "bom" e o "mau", pois podes enganar-se com o primeiro e tornar-se um inimigo do último.
Saiba que quem difama a outrem revela suas próprias faltas.
Se falas mal de alguém és pecador, mesmo se o que dissestes é verdade.

(Saadi de Shiraz, Al-Bustan)

A PEREGRINAÇÃO


Um dia, quando o Shaykh Abd Allah Mubarak (736-798) encontrava-se em Makka, viu em sonhos dois anjos descerem dos céus, perguntando-se quantos peregrinos haviam acudido aquele ano: "Seiscentos mil", disse um deles. "E quantos há cuja peregrinação tenha sido aceita?" "Nem um sequer", respondeu o outro anjo. "Entretanto, acrescentou, há em Damasco um sapateiro chamado Ali ibn Mufiq, que não efetuou a peregrinação em pessoa; pois bem, sua peregrinação foi aceita e lhe foi concedida a graça dos seiscentos mil peregrinos".

Quando despertou, o shaykh decidiu ir à Damasco conhecer aquele sapateiro. Finalmente o encontrou e lhe contou seu sonho.

Era um ancião que, ao ouvir aquele relato, começou a chorar. Contou que trinta anos antes, após haver poupado, a custa de grandes penas, trezentas e cinquenta moedas de ouro para ir a Makka, soube que seus vizinhos passavam fome. Então, entregou-lhes a soma dizendo-lhes: "Tomem o dinheiro para atender a vossos gastos, esta será a minha peregrinação".

(Farid ud-Din Attar, O Memorial dos Santos)

A ANCIÃ DE CORAÇÃO QUEIMADO

Um dia, no mercado de Bagdá, instalou-se um incêndio violento. Todos se puseram a gritar. O fogo provocou um enlouquecimento como no Juizo final.
Uma anciã aflita, bastão na mão, chegava não se sabe de onde. Alguém lhe disse: "Estás louca, não sigas, tua casa incendiou-se".
"Cala-te", respondeu ela, "Tu estás mais louco do que eu. Alláh nunca fará arder minha casa".
Extinguido o fogo, viram que muitas casas haviam queimado, mas a casa da senhora estava intacta.
Perguntaram-lhe: "Anciã, como sabias que seria assim?"
Ela humildemente respondeu: "Eu sabia que o fogo consumiria ou minha casa ou meu coração.
Mas Alláh, que já queimou meu coração na provação, não permitiria que minha casa também ardesse"

(Farid ud-Din Attar, O Livro Divino)

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Fica sabendo que a luminosa Vida, oculta e eterna, que irradiou sobre Adão, e que se encontrava da forma mais esplêndida na mais elevada estação, na melhor situação e na mais brilhante claridade, e que reluz na mais nobre glorificação em testemunhos sagrados e presença até se tornar uma coisa (manifestação) do Senhor, não se extravia nem se esquece. Eterna, não se apaga nem se cansa. Foi a Luz do Seu Nome oculto e segredo do Seu Nome grandioso...E quando Allâh, o Altíssimo, quis manifestar a Sua Perfeição às Suas criaturas... tomou essa Vida de Si e ocultou a Luz na luz mais resplandecente que a partir d´Ele acendeu...."

Ibn Qasî
"...Ao aludirmos, denominarmos e indicarmos, damos sinais e Allâh deixa descer a Luz sobre um dos Seus Nomes, sobre aquele que Ele quer; assim, deixa cair o Espírito sobre um dos Seus Nomes, sobre o que Ele quer, tal como envia o espírito do Seu Logos a um dos seus servidores, aquele que Ele escolhe..."

Ibn Qasî